sábado, 18 de setembro de 2010

Crescimento, distribuição e aumento da dependência externa

Artigo do economista e pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Guilherme Delgado, originalmente divulgado pela Radioagência NP.

O crescimento da economia brasileira será vigoroso em 2010, ao que tudo indicam os dados já apurados do primeiro semestre e os indicadores de conjuntura do terceiro trimestre. O ano deverá se encerrar com um crescimento do PIB acima dos 7%.

Por seu turno, esse ciclo de crescimento, que se observa desde 2004, um pouco esmaecido em 2009 pelo efeito da crise financeira externa, espera-se que venha a prosseguir em 2011. Mas a política econômica e a política social do novo governo, aliadas às condições de financiamento do mercado mundial podem manter, arrefecer ou cortar esse experimento ora em curso. No momento não se vislumbra a hipótese de corte abrupto. No entanto é preciso examinar melhor as bases dessa novidade brasileira – crescimento com distribuição, para enxergar os desafios que têm pela frente.

Uma característica peculiar desse crescimento recente têm sido a melhoria na distribuição da renda do trabalho, não tanto pela melhoria dos salários de mercado, mas pela eficaz aplicação de direitos sociais transformados em benefícios monetários e em espécie às famílias. Atualmente esses benefícios correspondem a praticamente um quarto da Renda Interna Bruta e precisariam continuar crescendo para prosseguir o efeito distributivo e de demanda efetivo que exercem no crescimento econômico.

Essa característica do crescimento econômico com distribuição de renda, limitada à renda do trabalho, tem necessariamente implicações sobre a produção do excedente econômico (excesso de bens e serviços produzidos e utilizados internamente relativamente às necessidade de subsistência da população), cujas conseqüências mais diretas aparecerão no sistema tributário e nas contas externas. Mas isto precisa ser melhor explicado.

Para fazer uma exemplificação inteligível ao leitor, vou utilizar uma contabilidade de números redondos, com dimensões nacionais, para chegar a idéia do excedente econômico, que é um conceito chave para se compreender o que está em renhida disputa na sociedade e nos meandros da economia e da política, sem que muitas vezes nos apercebamos.

Imaginemos um Produto Interno Bruto (PIB) de R$ 3 trilhões, uma População Economicamente Ativa que o produziu de 100 milhões de brasileiros e uma População de Idosos (60 anos ou mais), fora do mercado do trabalho, de 20 milhões de pessoas. Dadas essas informações, poderíamos definir o excedente econômico em um ano específico (2010), quando deduzíssemos do PIB toda a remuneração “socialmente necessária” para manter a população na condição de subsistência.

Tomando o salário mínimo como noção daquilo que é praticado como socialmente necessário e considerando alternativamente todos os trabalhadores ativos (100 milhões) ou os ativos mais os idosos (120 milhões de pessoas) teríamos um excedente econômico de 79% ou 73,5% do PIB (repectivamente 21% ou 24,5% de remunerações de subsistência).

Observe-se que ao definir o consumo de subsistência, incluindo ou não os idosos, com este ou aquele salário mínimo, definem-se tamanhos muitos distintos do excedente. Recorde-se que o salário mínimo atual de R$ 510, era de R$ 130 em 1998 e de R$ 57 reais na passagem da URV para o real em 1994.

Esses números arredondados expressam a situação econômica e demográfica do Brasil em 2010. Projetados à frente, com crescimento e continuidade desse padrão de distribuição, teríamos as seguintes implicações:

a) Para incluir os que ainda não se encontram no padrão de subsistência e elevar esse padrão com ganhos reais de salário mínimo é preciso obter novos recursos tributários (reforma tributária progressiva);

b) Mantido o excedente econômico nos níveis atuais, sem alteração na tributação do 10% mais ricos da população, detentores de dois terços a três quartos do excedente econômico, essa população recorrerá necessariamente a um padrão de consumo de bens e serviço muito por cima da dinâmica da produção interna, requerendo crescentes importações;

c) O sistema econômico para crescer precisa renovar e incrementar seus estoques de capital, o que necessariamente implica que hajam oportunidades (demanda) e decisões de investir, parte em recursos do excedente econômico interno, parte em recursos oriundos de passivos externos.

Em resumo o experimento atual de crescimento com distribuição para prosseguir precisa considerar a reforma tributária de caráter progressivo como essencial, a menos que abandone seu caráter distributivo.

Mas mesmo que crescimento ocorra, sem distribuição, o perfil distributivo do excedente econômico provocará inevitável gargalo externo, manifesto por elevado déficit em conta corrente para financiar consumo de alta renda e parte dos investimentos. Será mais um vôo de galinha, abortado pela próxima crise cambial.

Como se pode ver, não haverá como escapar dos temas reforma tributária e reforma da seguridade social para apoiar um modelo distributivo de crescimento; ou inversamente para estancá-lo ou invertê-lo de vez. Isto precisaria virar tema eleitoral, devidamente traduzido a linguagem do público geral.

Um comentário:

Remindo disse...

A saída do Aécio do PSDB já era conversa corrente entre os políticos de Minas. E o lançamento para mídia faltando menos de um mês para as eleições foi o golpe de misericórdia no Serra, no PSDB e na mídia de São Paulo. E ao afirmar que vai fundar um novo partido, aumenta seu valor para entrar no PMDB. Dizem nas Alterosas, que esta tudo acertado e que em 2012 o mineiro será lançado candidato a presidência da República. Quanto ao PSDB será o Partido do Geraldo, restrito ao estado paulista e o DEM seguirá os passos dos velhos dinossauros, a extinção. Quem viver, verá.

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