sábado, 7 de agosto de 2010

A sustentabilidade ambiental exige crescimento zero?


A destruição do meio ambiente e o crescimento parecem andar de mãos dadas. Por essa razão existe hoje um movimento importante que propõe um crescimento zero ou até um decrescimento nas economias do planeta como uma forma de travar a deterioração do meio ambiente.

Capitalismo sem crescimento? Não vai ser fácil. A destruição do meio ambiente e o crescimento parecem andar de mãos dadas. Por essa razão existe hoje um movimento importante que propõe um crescimento zero ou até um decrescimento nas economias do planeta como uma forma de travar a deterioração do meio ambiente.

O “decrescimento” é definido como uma redução, em termos físicos, na produção e no consumo, através de uma contracção no grau de actividade e não apenas de um incremento da eficiência. Num trabalho recente, Kallis-Schneider-Martínez Alier (www.esee2009.si) explicam que o decrescimento pode ser visto como uma redução voluntária, equitativa e gradual na produção e no consumo, de forma a garantir o bem-estar humano e a sustentabilidade ambiental a nível local e global, tanto a curto como a longo prazo.

Para atingir o decrescimento foram propostas muitas medidas relacionadas com tecnologia, trabalho, educação e crédito. Algumas dessas medidas estão relacionadas com políticas macroeconómicas. Propõe-se, por exemplo, uma reforma monetária em que desaparece a moeda fiduciária, considerando que assim se corta pela raiz a propensão para o crescimento desenfreado. A moeda fiduciária não é sustentada por reservas de ouro ou de um outro metal, valores ou divisas, de modo que o seu valor intrínseco é nulo. A sua função de meio de pagamento é possível por ter sido designada oficialmente como o instrumento monetário por excelência. A confiança derivada desta resolução permite que um simples pedaço de papel possa funcionar como instrumento monetário. Parece que os seguidores do decrescimento encararam sempre este mecanismo como um inimigo, por acharem que permite o crescimento sem fim ao carecer de um termo de referência tangível. Esta é uma visão errada e a prova é que, mesmo quando a moeda não era fiduciária, havia crescimento.

O crescimento também não encontra as suas origens numa patologia cultural, numa mania, num fetiche ou numa moda louca. O crescimento é a consequência directa do funcionamento das economias capitalistas. E esta afirmação aplica-se ao capitalismo tal como existia em Génova no século XVI ou ao mundo das megacorporações que impõem as suas regras nos mercados globais. Também é válido para descrever o que acontece no capitalismo industrial ou no financeiro.

Em poucas palavras, o crescimento é gerado por factores endógenos do capitalismo porque o objectivo do capital é produzir lucros sem um fim determinado. É esse o sentido do modo particular de circulação económica que define o capital. Pela lei do mercado, o objectivo não é produzir coisas mais ou menos úteis (ou decididamente inúteis), mas produzir lucros e reproduzir-se a si próprio. Por isso o capital é um motor de acumulação interminável, independentemente do facto de existir ou não moeda fiduciária e da mentalidade vigente. A concorrência intercapitalista é a manifestação desta característica do capital.

Nos Grundrisse, Marx assinala que «conceptualmente, a concorrência não é mais do que a natureza interna do capital, o seu carácter essencial, que surge e se realiza na interacção de muitos capitais, numa tendência interna que se apresenta como necessidade externa. O capital existe e só pode existir como muitos capitais e a sua determinação aparece como a interacção recíproca de uns com outros. Pelas forças da concorrência, o capital é continuamente acossado: “marcha, marcha!”»

Cada componente destes capitais é um centro privado de acumulação e sabe que se não agir como tal, será aniquilado pela concorrência. Por isso o capital está sempre a inaugurar espaços de rentabilidade: novos produtos, processos e mercados. Cada interstício e cada vazio é um território à espera de ser conquistado para a rentabilidade do capital. Para os seus olhos inquietos, tudo é um espaço de rentabilidade: os alimentos e a água, os recursos genéticos, as jazidas de petróleo ou os tranquilizantes para esquecer o stress quotidiano.

Poderíamos ter um sistema tecnológico tão eficiente que reduzisse a pegada ecológica mesmo com crescimento? Isso está por demonstrar, mas para já os lucros de eficiência foram contrabalançados pelo efeito escala e pelo efeito boomerang (ao incrementar a eficiência, os custos unitários diminuem, os preços baixam e aumenta o consumo).

Deve ficar claro que o crescimento capitalista é uma espécie de doença que destrói tudo, a começar pelo ser humano. O corolário de tudo isto é que a única forma de acabar com a loucura do crescimento é desfazendo-nos do capital. Evidentemente, isto dá início a outra discussão interessante. Enquanto isso, a única coisa que a teoria macroeconómica pôde fazer foi aperceber-se das consequências terríveis da estagnação nas economias capitalistas: desemprego, bens não vendidos, crise. Capitalismo sem crescimento? Não vai ser fácil.

Artigo de Alejandro Nadal publicado no jornal mexicano La Jornada, traduzido por Helena Pitta
Originalmente publicado na página Esquerda.Net.

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