Por Emir Sader, (pescado do blog do Emir)
A candidatura da Marina, as do Psol, do PSTU, do PCB e outras eventuais do mesmo campo, têm algo em comum: tentar caracterizar que o PT e o PSDB seriam variações da mesma alternativa. Daí deduzem a necessidade de outra candidatura, buscando romper o que consideram uma falsa alternativa. Daí também, implicitamente, a posição de abstenção ou voto em um segundo turno em que se enfrentassem Dilma a Serra.
Essa tentativa de igualização das duas candidaturas é essencial para que se tente aparecer como superação do que seria uma falsa dualidade e aponta, entre outras coisas, para um voto branco em um eventual segundo turno entre Dilma e Serra, de forma coerente com essa análise. Foi o que aconteceu no segundo turno entre Lula e Alckmin.
Para nos darmos conta do absurdo dessa posição, basta fazer o exercício de imaginar o que teria sido do Brasil com quatro anos de mandato de Alckmin no lugar de Lula – incluindo o enfrentamento da crise internacional. Não se conhece nenhum balanço autocrítico dos setores de esquerda, o que supõe que a mantêm, agora com o agregado de Marina, que em 2006, ainda ministra do governo, fez campanha ativamente, no primeiro e no segundo turno, o que faz pensar que quando ocupava aquele cargo, sua posição era uma, quanto teve que deixar o governo, mudou de avaliacao sobre o governo Lula e também sobre o caráter do bloco tucano-demista, haja vista suas fraternais relações com estes atualmente. (Fazendo temer até mesmo que os apóie, expressa ou veladamente no segundo turno.)
A incompreensão das diferenças entre as candidaturas da Dilma e do Serra decorre da incompreensão da realidade brasileira atual, o que permite esse e outros equívocos. Considerar que o bloco tucano-demista é similar ao bloco governista e que um governo da Dilma ou do Serra seriam similares para o Brasil corresponde a não dar valor à política internacional do governo atual, às políticas sociais, ao papel do Estado, à inserção internacional do Brasil – entre outros tantos temas.
Quem não sabe localizar onde está a direita, corre o grave risco de se aliar a ela. Um aliado moderado – um governo de centro-esquerda – é radicalmente diferente de um inimigo. Ao contrário da avaliação dos setores radicais que deixaram o PT, o governo mudou e mudou para melhor, desde que Dilma Rousseff substituiu Palocci como ministro coordenador do governo. Quem acreditou que o governo estava em disputa e que era possível um resgate seu pela esquerda, acertou, enquanto que os que tiveram uma avaliação puramente moral, acreditando que o governo tinha “mordido a maçã” do pecado da traição, caminhando para ser cada vez pior, erraram, se isolaram e desapareceram do campo político, lutando agora apenas por uma sobrevivência mínima no plano parlamentar.
Considerar que um governo da Dilma ou do Serra seriam a mesma coisa – assim como consideraram que o Brasil com Lula, nestes quatro anos, é o mesmo que teria sido com 4 anos de governo de Alckmin – é não valorizar o que significa a prioridade da integração regional e das alianças com o Sul do mundo, em contraste com os Tratados de Livre Comércio – a que o governo de FHC levava o Brasil – e com as alianças prioritárias com os países do centro do capitalismo, objetivo dos tucanos.
É não levar em conta as diferenças de enfrentamento da crise do governo FHC – de que Serra foi ministro nos dois mandatos – e a forma de enfrentá-la do governo Lula, com um papel ativo do Estado, com a diminuição e não o aumento da taxa de juros, com os aumentos salariais acima da inflação, com a rápida recuperação do nível do emprego, com a manutenção das políticas sociais.
É não considerar as diferenças substanciais entre o Banco do Brasil comprar a Nossa Caixa, mantendo-a como banco público, evitando que um banco paulista mais fosse privatizado pelos tucanos – o Banespa foi vendido a um banco espanhol e a Nossa Caixa teria destino similar, não fosse o atuação do BB.
Esses e outros aspectos ajudam a diferenciar e a projetar governos muito distintos no futuro – veja-se a equipe econômica do Serra, para se ter idéia, além dos ministérios que entregaria para o DEM.
Quando uma força de esquerda se equivoca sobre a polarização do campo político, querendo desconhecê-la, conforme seus desejos subjetivos, se torna intranscendente, não acumula capacidade de intervenção política. E, pior, a ação que logra obter, pode perfeitamente favorecer a direita, seja de forma explícita ou implícita.
A incapacidade de compreender a polarização política no Brasil de hoje entre dois blocos de forças claramente diferenciados inviabiliza uma política de construção de uma frente ampla de esquerda, com o sectarismo fazendo com que nem sequer entre si os grupos mais radicais da esquerda consigam coligar-se.
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