Em 2005, o sindicalista Jair Costa morreu estrangulado por policiais militares quando participava de uma manifestação contra o desemprego no setor coureiro-calçadista, em Sapiranga. Na última sexta-feira, o agricultor sem-terra Elton Brun da Silva foi assassinado com um tiro de espingarda calibre 12 pelas costas, durante uma operação de reintegração de posse de um latifúndio ocupado pelo MST em São Gabriel. Esse dois casos se somam a inúmeros outros e são ilustrativos de um dos traços mais retrógrados da sociedade brasileira.
Não eram criminosos, eram trabalhadores que lutavam para conseguir emprego, garantir seu sustento e oportunizar a seus filhos uma vida mais digna. Não tinham por objetivo nada além dos direitos consagrados na nossa Constituição. Agiam, portanto, dentro dos limites impostos pelo chamado "estado democrático de direito".
A ação dos órgãos de segurança nesses casos, e incluo aí também o Poder Judiciário e o Ministério Público, contrasta com o trato dado a criminosos de fato e de direito. Esses sim de alta periculosidade social. Nas ações da Polícia Federal contra quadrilhas que roubam milhões dos cofres públicos, por exemplo, sempre há choro e ranger de dentes da mídia corporativa e dos causídicos de plantão. Quando se trata dos chamados "ladrões de colarinho branco", discuti-se o uso de algemas, o conforto dos veículos que conduzem os meliantes, a exposição pública, as condições prisionais, os meandros e limites da atuação das autoridades, etc. Não faltam matérias denunciando o "estado policial" ou colunistas chamando os criminosos de "homens de bem", com "inteligência superior" entre outras pérolas.
Essas preocupações e essa atitude são totalmente ausentes quando se trata da repressão aos movimentos sociais de qualquer tipo. A segurança pública para o oligopólio midiático e os setores mais conservadores da sociedade brasileira continua a ser vista como uma espécie de "capitão do mato" na sociedade escravagista. O objetivo é vigiar e punir os pobres e mal nascidos. Para eles, os estratos superiores da sociedade são imunes criminalmente por razões de "ordem divina" ou por "direito natural".
É essa visão de mundo que luta contra uma força policial profissional, bem treinada e remunerada, capaz de utilizar os mais modernos meios de investigação criminal. É essa visão de mundo que não suporta que membros do Ministério Público e do Judiciário sejam capazes de aplicar a justiça a todos, independente de cor, sexo, raça ou condição social.
Sem derrotar os segmentos que promovem e sustentam as estruturas que permitem ao Estado brasileiro negar, em pleno século XXI, que "todos são iguais perante à lei" não construiremos um Brasil moderno.
Um comentário:
Há centenas de microfones e teleprompters com resíduos de pólvora. Terão de enfrentar o amor invencível de milhares de homens e mulheres que não traíram a sim mesmos. Os de alma intacta. Os que sobreviveram aos anos de chumbo sem dobrar a espinha. Os indispensáveis de que falava Bertold Bretch. E os que todos os dias, dos roçados, das escolas, das fábricas, dos remotos arrabaldes onde um orvalho de sonhos vai condensando em gotas, surgem, como tênues fios de água, tributários do rio que irá virar torrente. O ódio matou Elton Brum da Silva. Mas é o ódio de poucos contra o amor de muitos. O sonho sobrevive. As idéias não se matam. Há microfones e teleprompters com resíduos de pólvora... E de sangue. Porém, todos sabemos que a história nunca foi derrotada. Nas entranhas da pátria, inexorável, germina um grão de trigo. O seu nome era Elton. Nós, o chamamos companheiro.
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