Roberto Baggio: Não há dúvida que sim. O modelo atual entrou em crise e também atingiu o modelo de desenvolvimento da agricultura brasileira, baseada no agronegócio. E na medida em que a crise atinge em cheio o agronegócio, possibilita abrir portas para nós avançarmos em um programa de reforma agrária. E, mais do que nunca, a reforma agrária ocupa um espaço importante para resolver e enfrentar a crise atual.
Como a crise se refletiu no agronegócio?
Toda a economia do agronegócio está voltada para a agroexportação. E, à medida que a crise mundial atinge os países desenvolvidos, a agroexportação entra em crise porque não tem mais mercado. Os preços estão caindo, o Brasil importa um conjunto de matérias primas de sementes, de insumos e isso está tudo vinculado ao dólar, então encarece o mercado interno. O uso abusivo de veneno, herbicidas, contribui para contaminação dos alimentos, isso refreia a compra de máquinas, enfim, a crise revelou que o agronegócio não é uma alternativa para organizar o modelo agrícola brasileiro. O que a gente precisa é superar esse modelo atual que concentra propriedade e que tem como objetivo central só o acúmulo de dinheiro.
Mas de que maneira a reforma agrária nos ajudaria a superar essa crise?
Agora precisamos de uma conjugação de esforços, no sentido de que o Estado brasileiro tome um conjunto de medidas para desconcentrar a terra, para evitar o êxodo [de trabalhadores rurais] e para resolver o problema dos grandes centros urbanos. É uma política estruturante no seu sentido pleno. [A reforma agrária] Ajuda o país, os trabalhadores que se beneficiam, os pequenos municípios e também gera emprego. Então é uma política estruturante que resolve o problema da comida, da moradia, do trabalho, da educação, da saúde, da geração de imposto e do crescimento do país.
Mas, concretamente e de imediato, o que precisa ser feito pela reforma agrária?
É preciso que neste momento o governo pense a reforma agrária como uma política estruturante, e para isso ela tem que ser complementada com uma iniciativa política rápida do governo, em torno das desapropriações e a estruturação produtiva dos projetos de assentamentos, estruturação social na área da saúde e da educação. Em paralelo a isso, nós precisamos estruturar um programa de agricultura de médio e longo prazo, que seja um programa popular e que recupere a agricultura, enquanto uma política voltada para o mercado interno, para produção de alimentos e que preserve a terra, as sementes e a biodiversidade. Ou seja, os recursos naturais e minerais, e a riqueza de nossa agricultura, têm que estar focada no desenvolvimento nacional, na geração de empregos aqui.
A jornada também trará alguma resposta ao ministro do STF, Gilmar Mendes, que acusa o MST de usar as verbas da reforma agrária para ocupações?
O movimento nunca precisou de dinheiro público para fazer ocupação, porque é o estado de necessidade que faz com que as pessoas lutem, se mobilizem e avancem. A jornada de lutas de abril é o momento de denunciar a ausência da reforma agrária, fazendo que o conjunto da sociedade amadureça, no sentido de buscar solução para os problemas que a sociedade brasileira enfrenta. O central é não permitir que a reforma agrária entre no ralo, como o ministro quer, e sim fazer com que ela reocupe uma agenda política positiva, afirmativa, de trabalho, de saúde, de educação, de soberania e de soluções para a crise que atinge a grande maioria da população.
Para além da reforma agrária, esta jornada reivindica alguma outra medida para combater a crise?
Sim, nossa luta é para que o governo implemente um conjunto de políticas públicas para enfrentar a crise brasileira, entre elas, por exemplo, ter o controle sobre o câmbio, sobre o capital financeiro, investir o que a sociedade paga de imposto na geração de empregos, no investimento em capital produtivo, na educação e saúde. O que a gente precisa é ir acumulando força, envolvendo o conjunto da sociedade brasileira e exigir que o governo federal tome um conjunto de políticas públicas que preserve os interesses, os direitos da grande maioria da população, e que ao mesmo tempo, impeça que o capital externo e os grandes grupos econômicos se apropriem da nossa riqueza, e dos nossos impostos em benefício dos seus interesses.
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